Meu caderno On line

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Inez Nerez

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Entenda por que o filme sobre Maomé foi considerado ofensivo por muçulmanos



Milhares de pessoas têm protestado em países da Ásia, da África e do Oriente Médio contra um filme feito nos Estados Unidos, que retrata o profeta Maomé. A BBC explica por que a obra tem causado tanta indignação:


O que o filme mostra?

O vídeo, que é o trailer de um filme mais longo chamado Innocence of Muslims ("Inocência de Muçulmanos", em tradução livre), parece retratar o islã como uma religião de violência e ódio, e Maomé, como um homem tolo e com sede de poder.

A primeira cena do vídeo mostra uma família cristã copta vivendo em um Egito em processo de radicalização e sofrendo ataques de muçulmanos. O pai diz às filhas que os muçulmanos estão matando os cristãos e que o Estado islâmico está escondendo seus crimes.


Em seguida, o filme mostra o profeta Maomé com sua família e seus seguidores no deserto. Maomé é mostrado em posições sexuais com a sua mulher e com outras. Uma das sequências que mais insultaram os muçulmanos inclui uma referência a Maomé sancionando o abuso de crianças, e em determinado momento o profeta revela ser homossexual.
Muitos dos personagens recitam versos supostamente tirados do Corão, mas claramente inventados, falando de matar e extorquir pessoas.


Por que o conteúdo é tão ofensivo?

Qualquer representação de Maomé já vai contra os ensinamentos islâmicos - imagine então uma representação satírica e crítica. A descrição pouco elogiosa da mulher de Maomé e de seus seguidores também é considerada uma blasfêmia.
O princípio fundador do islã é que o Corão é a palavra direta de Deus, revelada a Maomé para ser divulgada à humanidade. Sendo assim, o fato de o vídeo sugerir que o Corão é inspirado em versos do Antigo e do Novo Testamento também é uma afronta aos muçulmanos.
Outras referências aos casos de Maomé com mulheres, a sua ganância e sua tendência à violência também são ofensivas em qualquer contexto.


O que se sabe sobre o vídeo?

Acredita-se que o filme completo tenha cerca de uma hora, ainda que o vídeo mais visto seja um trailer de 14 minutos, amplamente divulgado em inglês e árabe.
O filme tem características amadoras, no que diz respeito a atores, cenário e produção. Foi filmado durante cinco dias em um estúdio da Califórnia em agosto do ano passado, com cerca de 50 atores e outras dezenas de produtores.
A maior parte do conteúdo ofensivo parece não estar presente no filme original, e sim ter sido dublada posteriormente.

Quem é Nakoula Basseley Nakoula?

O trailer foi colocado no YouTube por uma conta ligada ao usuário "sambacile" - inicialmente descrito como um judeu israelense que levantou US$ 5 milhões com israelenses nos EUA para fazer o filme. Mas essa pessoa não existe.
Autoridades dos EUA agora dizem ter identificado Nakoula Basseley Nakoula, um egípcio cristão copta que vive na Califórnia e pode ser o autor do filme. Basseley, condenado por fraude em 2010 e forçado a pagar mais de US$ 790 mil em restituições, é suspeito de ter usado o pseudônimo "Sam Bacile" para esconder sua identidade. Ele nega as acusações.


O que dizem os atores?

Eles alegam que foram enganados a respeito do filme, dizendo que o projeto original não tinha nenhuma relação com o islã ou com o profeta. Segundo eles, todas as referências a Maomé e os insultos religiosos foram adicionados depois, na fase de pós-produção.
Cindy Lee Garcia, que fez uma pequena participação no filme, disse ao site Gawker.com que ela e seus colegas receberam um roteiro de um filme chamado Desert Warriors ("Guerreiros do Deserto", em tradução livre), que seria um drama histórico ambientado no Oriente Mèdio.
A atriz confirmou ter visto Nakoula durante as gravações.

Tem algo mais acontecendo nessa polêmica sobre o filme?

Como ficou evidente depois da publicação dos charges sobre Maomé em 2006, líderes políticos e religiosos na região se utilizam desses supostos insultos ao islã para provocar manifestações públicas.
Manifestações começaram a se espalhar do Egito para outros países - inflamado talvez pela mídia local - por causa da desconfiança em relação ao Ocidente, algo que muitos grupos vêm capitalizando sobre a polêmica.
Desilusão, falta de oportunidades e ódio contra o establishment podem causar protestos em qualquer contexto.


A cultura muçulmana medieval


A cultura muçulmana medieval 
O principal prestígio cultural muçulmano consiste em seu sincretismo, pois as relações com as outras civilizações possibilitaram os muçulmanos um amplo conhecimento. 


Palácio de Alhambra Granada, Espanha
No campo das artes plásticas, os muçulmanos não tiveram tanto destaque, pois a religião árabe não permitia a exposição de formas vivas, porém na Arquitetura estavam bem desenvolvidos, utilizando arcos e cúpulas, e a Pintura se restringia aos arabescos, onde as letras do alfabeto árabe contribuíam de forma decorativa. 
Os árabes também foram os grandes responsáveis pela descoberta de algumas leis da Óptica, em Física; pela evolução da Álgebra, na Matemática; e pela descoberta dos ácidos e sais, em Química. 


Palácio de Alhambra Granada, Espanha
No campo das artes plásticas, os muçulmanos não tiveram tanto destaque, pois a religião árabe não permitia a exposição de formas vivas, porém na Arquitetura estavam bem desenvolvidos, utilizando arcos e cúpulas, e a Pintura se restringia aos arabescos, onde as letras do alfabeto árabe contribuíam de forma decorativa. 
Os árabes também foram os grandes responsáveis pela descoberta de algumas leis da Óptica, em Física; pela evolução da Álgebra, na Matemática; e pela descoberta dos ácidos e sais, em Química. 


O filósofo Averróis foi um importante nome para a Filosofia muçulmana  que além da fazer a tradução de inúmeras obras gregas para árabe, explicava as teorias da Platão. Avicena foi um personagem que exerceu uma notável influência na Medicina, responsável pela descoberta da origem da contaminação da tuberculose, além de fazer a descrição da pleurisia e de algumas doenças nervosas. 
Na literatura destaca-se o Livro dos Reis, que contém narrações referentes ao Império Persa; outro destaque vai para o poema Rubayyat, de Omar Khayyam. 



Maomé e o Islamismo ..entenda melhor






Maomé, profeta árabe nascido em Meca, foi responsável pela criação da religião muçulmana e do império árabe. Fazia parte da tribo dos Coraixitas, mas era descendente dos Hashemita  Com apenas 6 anos de idade Maomé ficou órfão e foi criando primeiramente pelo avô paterno, e depois pelo tio que foi quem incentivou Maomé a entrar no comércio, assim passou a ter contato com diversas religiões, especialmente o cristianismo e o judaísmo, e dessa forma construiu um ecletismo religioso.
 Além de sua habilidade política, Maomé era chefe militar e legislador, dando sempre privilégio à religião. 
Aos 25 anos casou-se com a rica viúva Cadidja, pois este casamento lhe proporcionaria uma estabilidade financeira que permitiria à ele um melhor desenvolvimento intelectual estruturando assim o seu sistema religioso. 
Após completar 40 anos, seguindo a tradição, Maomé cumpriu sua missão de aclamar as revelações trazidas de Deus pelo arcanjo Gabriel. Maomé revelava que só havia um Deus, de quem ele era profeta, e esse monoteísmo entrava em contradição com as crenças tradicionais dos Coraixitas, e com isso Maomé foi ridicularizado e em seguida perseguido, em vista disso, Maomé foi obrigado a se refugiar para Iatribe em 622. 



Maomé diante da Caaba. 
Nesta região havia um confronto entre as tribos árabes e os judeus, e Maomé conseguiu apaziguar esta oposição, e em seguida engatou uma luta contra Meca pelo domínio das rotas comerciais. E a conquista desta cidade veio somente em 630, ano em que Maomé implantou o monoteísmo de onde surgiu o Islão, de onde ele se tornou profeta. 
Em 632 Maomé morreu na cidade de Medina, sem deixar nomeado seu sucessor, porém deixou a comunidade espiritualmente unida e com uma excelente organização política baseada na doutrina islâmica de seu livro, o Corão que foi publicado somente em 650.

A nova religião foi nomeada de islamismo ou Islã e traz pregações monoteístas, ou seja, seus adeptos adoram um só Deus, de natureza unicamente divina. 





A acessão de Maomé ao Paraíso. Segundo a tradição muçulmana, o Profeta faleceu em Medina, 
mas sua alma foi transportada para Jerusalém, de onde ascendeu ao Céu.


quinta-feira, 27 de setembro de 2012





Espumas Flutuantes

Castro Alves
Castro Alves (1847-1871) apareceu numa época particularmente agitada da vida política e ideológica do Brasil. A ebulição daquele momento envolveu a literatura e fez da poesia declamada em espaços públicos (inclusive nas praças) uma forma privilegiada de comunicação.

Era um tempo em que se faziam frequentemente comícios e se discutia a Guerra do Paraguai, a questão militar, os problemas centrais do Segundo Império, a viabilidade da República etc.

Com seu discurso de tom elevado e sua figura bela e empolgante, o poeta chegava na hora certa. Foi consagrado principalmente porque sua eloquência agradava muitíssimo ao público da época em que viveu.

A escravidão foi o tema mais candente de seus poemas de sentido social, mas ele não foi apenas o "poeta dos escravos", como é chamado, e "Navio Negreiro", "Vozes d'África" e outros poemas de temática abolicionista não foram incluídos em Espumas Flutuantes (coletânea que publicou em 1870), reservados que foram para outro livro, afinal publicado postumamente, chamado Os Escravos.

Castro Alves foi também um grande poeta do amor e da morte, e esses temas existenciais avultam em Espumas Flutuantes, deixando em segundo plano a poesia de fundo cívico e social que também se encontra no livro. Como poeta do amor, Castro Alves é um caso singular entre os nossos românticos.

Sua expressão amorosa é carregada de sensualidade, e a representação da mulher, nos melhores momentos de seus poemas eróticos, é marcada por uma realidade, uma "carnalidade" inteiramente ausente da poesia de seus contemporâneos e predecessores imediatos, que tendiam à pura idealização feminina, seja na figura da mulher-anjo, seja na da mulher-demônio.

Castro Alves, diversamente, fala de mulheres "de carne e osso", por assim dizer, mulheres que são objeto de desejos concretos. A escola condoreira, de que ele é a maior figura, caracteriza-se pelo gosto das imagens grandiosas, realçadas por antíteses, por hipérboles (exageros) e pelo tom elevado, de oratória enfática e messiânica, a serviço de causas sociais.

No poeta das Espumas Flutuantes, essas características não se encontram apenas em poemas de temática que se pode chamar épica, porque abordam grandes questões coletivas, mas aparecem também em poemas propriamente líricos, seja os de tema amoroso, seja os que nos revelam o poeta como um admirável pintor de paisagens.

Suas imagens, quase sempre arrojadas e intensas, costumam alternar o pequeno e o grandioso e têm o que se pode chamar "pendor cósmico" - uma preferência pelos magnos elementos da natureza, como oceanos, céus, noite, estrelas, montanhas e tufões.

Ficha
  • Gênero: poesia lírica, com alguns poemas de empostação épica
  • Estilo: romântico "condoreiro" (registro elevado, grandioso)
  • Poemas famosos: "Hebréia", "Mocidade e Morte", "O Gondoleiro do Amor", "O 'Adeus' de Teresa"



  • Análise da obra

    Único livro de poesia publicado pelo autor em vida. 

    Temática social e política inspirada em visão libertária. De vida breve e trágica, o poeta baiano foi um grande nome do romantismo.

    Publicado em 1870, Espumas Flutuantes é a única obra de Castro Alves que teve a edição revisada pelo autor. O título sugere transitoriedade, pois o poeta sente que seu fim está próximo. 

    O volume contém 53 poemas lírico-amorosos e poemas de caráter épico-social.

    Ao tratar do amor, Castro Alves refere-se não só à mulher de forma idealizada, mantendo as tradições do Romantismo, mas distoa do movimento ao buscar o amor carnal, real e tingido com as cores do erotismo - "Boa-noite, Maria! É tarde... é tarde... / Não me apertes assim contra teu seio."(in "Boa-noite"). Em Espumas Flutuantes, Castro Alves retoma o tema do amor em sua sensualidade e em sua realização. Transformando o sentimento amoroso em pleno sentido de prazer e sofrimento, descreve cenas oportunas da paixão humana. Em O adeus de Teresa, emOnde estás? e em É tarde!, por exemplo, percebemos a plenitude do lirismo de Castro Alves.

    Ainda dentro das produções líricas, o poeta refere-se à natureza que, em seus versos, se torna vibrante e concreta, emoldurada por um sistema dinâmico de imagens que geralmente são tomadas de aspectos grandiosos do universo - o mar, os astros, a imensidão ou o infinito.

    Devem ser destacados os seus versos de cunho existencial que ganham plenitude quando apregoam o gozo e os prazeres da vida - "Oh! eu quero viver, beber perfumes / Na flor silvestre que embalsama os ares (...) Morrer... quando este mundo é um paraíso, / E a alma um cisne de douradas plumas" (in "Mocidade e Morte") -, marcando novo momento da literatura romântica no Brasil que, até então, embebia-se no pessimismo da geração do "mal do século". 

    A poesia lírica de Castro Alves, nas duas espécies principais, a amorosa e a naturalista, está representada em Espumas Flutuantes. Nesse livro, ao lado de traduções e paráfrases de Byron, Hugo, Musset, figuram também composições de caráter épico-social, como O Livro e a América,Ode ao Dous de JulhoPedro Ivo, paradigmas do condoreirismo do poeta.

    O mesmo já não acontece nos poemas em que o poeta registra êxtases e desalentos amorosos:HebréiaBoa Noite, bem como o ciclo inspirado por Eugênia Câmara, ao qual pertencem entre outros, O Gondoleiro do AmorHino ao SonoÉ Tarde. Em tais poemas, aparado das demasias verbais, o verso se faz sugestivo e as metáforas naturais, para expressarem a experiência amorosa em sua plenitude carnal e sentimental, plenitude que, entre os nossos românticos, Castro Alves foi o único a ostentar.

    Destacam-se ainda, na pauta lírica, os momentos introspectivos de dúvida e fatalismo em face da existência (Mocidade e Morte) e, sobretudo, os de exaltação perante os espetáculos da Natureza, que, ajudado por uma sensibilidade eminentemente plástica e visual, o poeta fixou em belos quadros paisagísticos, que antecipam certa linha formal do Parnasianismo (Sub Tegmine Fagi,Aves de Arribação).

    Estilo

    Grandiloqüente, linguagem ornamental, pontuação abundante, escolha vocabular cuidada. Utiliza quase todas as figuras de linguagem, como: metáfora, comparações, hipérboles, assonâncias, apóstrofes. Busca a grandiosidade poética, chegando aos exageros e ao mau gosto. Um traço marcante é a oralidade e a visível intenção de dizê-la para grandes platéias. 








    Temas e formas

    1. O amor e a mulher

    Contrapondo-se ao amor irrealizado e não-correspondido que vogava até então, Castro Alves acrescenta­lhe a realização plena.

    Pelas páginas de Espumas Flutuantes, vemos passar indícios de paixão integralcomo a sensualidade de Adormecida, o ciúme de O Adeus de Teresa, e um emaranhado de seios, colos, cabelos e perfumes, que sensualizam os perfis femininos de Castro Alves.

    Uma noite, eu me lembro... Ela dormia

    Numa rede encostada molemente...

    Quase aberto o roupão... solto o cabelo

    E o pé descalço do tapete rente.

    (Adormecida)

    Quando voltei.., era o palácio em festa!...

    E a voz d’Ela e de um homem lá na orquestra

    Preenchiam de amor o azul dos céus.

    Entrei!... Ela me olhou branca... surpresa!

    E ela arquejando murmurou-me. “Adeus!”

    (O Adeus de Teresa)

    Caminham juntas a mulher-anjo, a amante e a prostituta, imagem assumida pela amada que lhe causa decepções.

    Eras a estrela transformada em virgem!

    Era um anjo, que se fez menina!

    Era a estrela transformada em virgem.

    (Murmúrios da Tarde)

    Mulheres que eu amei!

    Anjos louros do céu! virgens serenas!

    Madonas, Querubins ou Madalenas!

    Surgi! Aparecei!

    (Fantasmas da Meia-Noite)

    Curiosamente, chega a comparar espécies de amor em Os Três Amores, no qual aparecem o amor espiritual e místico de Tasso (que ele retoma em Dulce), o autor voluntarioso de Romeu (que ele volta a abordar em Marieta) e o amor não-convencional e vaidoso de D. Juan (que também aparece em Bárbora).

    Certo...   serias tu, donzela casta, 

    Quem me tomasse em meio do Calvário 

    A cruz de angústia, que o meu ser arrasta!...

    (Dulce)

    Afoga-me os suspiros, Marieta!

    Ó surpresa! ó palor! ó pranto! ó medo!

    Ai! noites de Romeu e Julieta!...

    (Marieta)

    Garganta de um palor alabastrino, 

    Que harmonias e músicas respira... 

    No lábio — um beijo... — no beijar — um hino;

    (Bárbora)

    2. A morte

    Atingido desde cedo pela moléstia que lhe acabaria com a vida, Castro Alves nos mostra uma grande preocupação com a morte, encarada como amargurada expectativa face à sua pouca idade e um empecilho às grandes realizações de que se julga capaz.

    Oh! eu quero viver; beber perfumes

    Na flor silvestre, que embalsama os ares;

    Ver minh ‘alma adejar pelo infinito,

    Qual branca vela n ‘amplidão dos mares.

    No seio de mulher há tanto aroma...

    Nos seus beijos de fogo há tanta vida...

    Árabe errante, vou dormir à tarde

    À sombra fresca da palmeira erguida

    Mas uma voz responde-me sombria:

    Terás o sono sob a lájea fria.

    Morrer... quando este mundo é um paraíso,

    E a alma um cisne de douradas plumas:

    E eu sei que vou morrer.. dentro em meu peito

    Um mal terrível me devora a vida:

    Triste Ahasverus, que no fim da estrada,

    Só tem por braços uma cruz erguida.

    Sou o cipreste, qu ‘inda mesmo flórido,

    Sombra de morte no ramal encerra!

    Vivo que vaga sobre o chão de morte,

    Morto entre os vivos a vagar na terra.

    (Mocidade e Morte, anteriormente O Tísico)

    Um dos autógrafos traz à margem: “No sótão, ao toque da meia-noite, quando o peito me doía e um pressentimento me pesava n’alma”. A data é “Recife, 7 de outubro de 1864”. Castro Alves tinha então 17 anos. Observe que, apesar da presença da morte, este poema é um hino de amor à vida, aos prazeres.

    3. A Natureza

    Castro Alves fundamenta suas imagens e metáforas nos aspectos grandiosos da natureza (infinito, oceano, deserto etc.) e é freqüente a alusão às aves de grande porte (o condor, a águia, o albatroz).

    Ao país do ideal, terra das flores,

    Onde a brisa do céu tem mais amores

    E a fantasia lagos mais azuis...

    E fui... e fui... ergui-me no infinito,

    Lá onde o vôo d’águia não se eleva...

    Abaixo via a terra abismo em treva!

    Acima o firmamento abismo em luz!

    (O Vôo do Gênio)

    4. A consciência da própria grandeza

    É freqüente a alusão ao papel do poeta, à predestinação para as grandes causas, à missão de reformar a sociedade pela palavra poética.

    Eu sinto em mim o borbulhar do gênio,

    Vejo além um futuro radiante:

    Avante! brada-me o talento n ‘alma

    E o eco ao longe me repete avante! -

    O futuro... o futuro... no seu seio...

    Entre louros e bênçãos dorme a Glória!

    Após um nome do universo n’alma,

    Um nome escrito no Panteon da História.

    (Mocidade e Morte)

    5. A liberdade

    Não! Não eram dois povos que abalavam

    Naquele instante o solo ensangüentado...

    Era o porvir em frente do passado,

    A Liberdade em frente à Escravidão,

    Era a luta das águias e do abutre,

    A revolta do pulso contra os ferros.

    O pugilato da razão contra os erros

    O duelo da treva e do clarão!...

    (Ode ao Dous de Julho)

    Observe a freqüência das antíteses.

    6. A crença no progresso

    Ao contrário da tendência regressiva, ressentida e passadista das gerações anteriores, que viam com desconfiança o progresso, Castro Alves, típico representante da burguesia liberal progressista, vê com entusiasmo a chegada da locomotiva, da instrução, do livro.

    Oh! Bendito o que semeia

    Livros, livros à mão-cheia...

    E manda o povo pensar!

    O livro caindo n ‘alma

    É germe que faz a palma.

    É chuva -que faz o mar

    Agora que o trem de ferro

    Acorda o tigre no cerro

    E espanta os caboclos nus,

    Fazei desse rei dos ventos

    Ginete dos pensamentos

    Arauto da grande luz!...

    (O Livro e a América)

    7. A poesia participante

    Aqui, o ideal republicano:

    República!... Vôo ousado

    Do homem feito condor!

    Raio de aurora inda oculta

    Que beija a fronte ao Tabor!

    Deus! Por qu‘enquanto que o monte

    Bebe a luz desse horizonte,

    Deixas vagar tanta fronte,

    No vale envolto em negror?!

    (Pedro Ivo)

    (Pedro Ivo foi herói da Revolução Praieira, e símbolo do ímpeto revolucionário para os jovens de seu tempo.)

    Aqui, o “povo no poder”:

    A praça! A praça é do povo

    Como o céu é do condor;

    É o antro onde a liberdade

    Cria águias em seu calor

    Senhor!... pois quereis a praça?

    Desgraçada a populaça

    Só tem a rua de seu...

    Ninguém vos rouba os castelos,

    Tendes palácios tão belos...

    Deixai a terra ao Anteu.

    (O Povo no Poder)

    Observe neste texto, e no anterior, as alusões ao condor. Este último poema é dos mais típicos de Castro Alves e inspirou música de carnaval de Caetano Veloso e uma paródia irônica de Carlos Drummond de Andrade:

    “A PRAÇA! A PRAÇA É DO POVO!”

    Não, meu valente Castro Alves, engano seu.

    A praça é dos automóveis. Com parquímetro.

    (Carlos Drummond de Andrade)



    quarta-feira, 26 de setembro de 2012

    O Primo Basílio, de Eça de Queirós


    Publicado em 1878, O Primo Basílio é um dos mais famosos "romances de tese" de Eça de Queirós. 

    Narrado em 3ª pessoa, apresenta um narrador onisciente que não consegue distanciar-se por completo de suas personagens, o que se caracteriza pela sua onisciência pelo emprego do discurso livre indireto. Há uma intimidade-identificação entre quem narra e quem vive a história.

    Eça de Queirós reproduz os acontecimentos, os tipos e os comportamentos humanos das personagens de forma fiel. Há um abuso do recurso da descrição e um exagero no uso de adjetivos. A ironia é também intensamente presente neste romance. 

    A história de passa na segunda metade do século XIX.



    O espaço é Lisboa, o Alentejo, o Paraíso e Paris. 
    Estes últimos lugares não são mencionados diretamente pelo narrador, mas apenas referidos.

    Lisboa é o cenário da crítica de Eça de Queirós, é por onde transitam as personagens e onde elas expõem suas condições sócio-econômicas e históricas, é a sociedade portuguesa. O Alentejo é o espaço que rouba Jorge de Luísa, deixando-a num marasmo sem fim. Paris é o cenário que devolve Basílio à Luísa, trazendo alegria e a novidade de uma vida de prazeres e aventuras. A casa é o espaço privilegiado do romance, onde se passam as cenas entre Luísa e Juliana. 

    O Paraíso serve de contraponto da vida doméstica e do mundo das alcovas.

    As personagens de O Primo Basílio podem ser consideradas o protótipo da futilidade, da ociosidade daquela sociedade.


    Influenciado pela fase realista de Balzac e por Flaubert, Eça de Queirós faz, nesta etapa de sua carreira, um inquérito da vida portuguesa.


    A obra combate as principais instituições: a Burguesia, a Monarquia e a Igreja. Critica a cidade, a fim de sondar e analisar as mesmas mazelas, desta vez na capital: para tanto, enfoca um lar burguês aparentemente feliz e perfeito mas com bases falsas e igualmente podres.


    A criação dessas personagens denuncia e acentua o compromisso de O primo Basílio com o seu tempo: a obra deve funcionar como arma de combate social. A burguesia - principal consumidora dos romances nessa época - deveria ver-se no romance e nele encontrar seus defeitos analisados objetivamente, para, assim, poder alterar seu comportamento. O autor critica veementemente o comportamento medíocre da família lisboeta de classe média e usa o adultério como pano de fundo.



    Enredo

    Os protagonistas dessa obra são Jorge que além de ser um bem-sucedido engenheiro, é funcionário de um ministério, e Luísa, uma moça romântica e sonhadora. Formam o típico casal burguês de classe média da sociedade lisboeta do século XIX. Para completar a felicidade do casal faltavam-lhe apenas um filho.

    Havia um grupo de amigos que freqüentava sempre a casa do casal, como era chamada a residência pela vizinhança pobre. Este grupo era constituído por D. Felicidade, a beata que sofria de crises de gasosas, que morria de amores pelo Conselheiro; Sebastião, amigo íntimo de Jorge; Conselheiro Acácio, o bem letrado; Ernestinho, e as empregadas Joana, que era assanhada e namoradeira, e Juliana que era revoltada, invejosa, despeitada e amarga, responsável pelo conflito do romance.

    Luísa ainda mantém amizade com uma antiga colega, Leopoldina - chamada a "Pão-e-Queijo" por suas contínuas traições e adultérios, o que não é bem visto pelo marido. Por conta disso, Juliana, a empregada maldosa, espera apenas uma oportunidade para apanhar a patroa "em flagrante".

    A felicidade e a segurança de Luísa passam a ser ameaçadas quando Jorge viaja a trabalho para Alentejo afim de fiscalizar suas minas. Após a partida, Luísa fica enfadada sem ter o que fazer, no marasmo e em uma melancolia pela ausência do marido. É nesse meio-tempo que Basílio chega do exterior. Ele e Luísa haviam namorado antes dela conhecer Jorge.

    Conquistador e "bon vivant", o primo não leva muito tempo para reconquistar o amor de Luísa, agora transformado em ardente paixão e isso faz com que Luísa pratique o adultério.

    Os encontros entre os dois se sucedem, há troca de cartas de amor. Uma delas é interceptada por Juliana, graças aos conselhos "sábios" de tia Vitória. A empregada começa chantagear a patroa, Luísa. Com isso, Luísa se transforma em escrava de Juliana, e começa a adoecer. Por causa de sua frágil constituição, os maus tratos que sofre de Juliana logo lhe tiram o ânimo, minando-lhe a saúde. Basílio foge covardemente, deixando-a sem apoio.

    Jorge volta e de nada desconfia, pois Luísa satisfaz todos os caprichos da criada, enquanto tenta todas as soluções possíveis, até que encontra a ajuda desinteressada e pronta de Sebastião, o qual, armando uma cilada para Juliana, intentando levá-la presa, acaba por provocar-lhe um ataque e a morte.

    É um novo tempo para Luísa, cercada do carinho de Jorge, de Joana e da nova empregada, porém, tarde demais: enfraquecida pela vida que tivera de suportar sob a tirania de Juliana, é acometida por uma violenta febre. Em delírio, conta a Jorge seu adultério, fazendo-o entrar em desespero e, no entanto, perdoar-lhe a traição. De nada adiantam os carinhos e cuidados do marido e dos amigos de que foi cercada, nem o zelo médico que chegou a raspar-lhe os longos cabelos. Luísa morre e o lar antes "formalmente feliz", se desfaz.

    O romance termina com a volta de Basílio e seu cinismo, ao saber da morte da amante, quando comenta com um amigo que se soubesse que Luísa havia morrido teria trazido Alphonsine, a amante que tem em Paris.









    O Alienista (Conto de Papéis avulsos), de Machado de Assis


    Estrutura da obra

    Trata-se de um conto um tanto longo, estruturado em treze capítulos. Quanto à montagem, é interessante observar que Machado de Assis se fundamenta em possíveis "crônicas". Observe que, com alguma freqüência, ele se refere aos "cronistas" e às "crônicas da vila de Itaguaí" como, aliás, tem início O Alienista: "As crônicas da vila de Itaguaí dizem que em tempos remotos vivera ali um certo médico, o Dr. Simão Bacamarte, filho da nobreza da terra e o maior dos médicos do Brasil, de Portugal e das Espanhas." .

    Também o fecho do conto apresenta a mesma referência: "Dizem os cronistas que ele morreu dali a dezessete meses, no mesmo estado em que entrou, sem ter podido alcançar nada". 




    Foco narrativo

    O narrador é em 3ª pessoa, portanto, onisciente. A intenção do narrador é a análise do comportamento humano: vai além das aparências e procura atingir os motivos essenciais da conduta humana, descobrindo, no homem, o egoísmo e a vaidade. A intencionalidade crítica do narrador não se reflete somente ao ser humano de forma geral. Ele critica, também, a postura do cientista e do extremo cientificismo do final do século XIX. Conseqüentemente, o narrador termina por criticar a Escola Naturalista.

    Tempo / Ação

    Percebe-se que toda a história se passa no passado, havendo o uso do flash back: "As crônicas da Vila de Itaguaí dizem que, em tempos remotos, vivera ali um certo médico: o Dr. Sr. Bacamarte.

    "O tempos remotos" a que se referem as crônicas, pelas indicações dadas, se remontam à primeira metade do século XVIII (= reinado de D. João V). 

    A ação transcorre, como já se viu, em Itaguaí, "cidadezinha do Estado do Rio de Janeiro, comarca de Iguaçu", conforme declara o crítico Massaud Moisés em nota de pé-de-página da edição que estamos consultando.





    Bagagem Adélia Prado (interpretação)


    Extraído do livro Bagagem 4. ENREDO PARA UM TEMA






    Ele me amava, mas não tinha dote, só os cabelos pretíssimos e um beleza de príncipe de estórias encantadas. Não tem importância, falou a meu pai, se é só por isto, espere. Foi-se com uma bandeira e ajuntou ouro pra me comprar três vezes. Na volta me achou casada com D. Cristóvão. Estimo que sejam felizes, disse. 
    O melhor do amor é sua memória, disse meu pai. Demoraste tanto, que...disse D. Cristóvão. Só eu não disse nada, nem antes, nem depois. 





     O poema é uma referência poética ao anti-ecológico silenciamento das mulheres, onde, pelo refazer irônico do autoritarismo da supremacia masculina desvendam-se exigências coercitivas hierarquizantes imputadas, desde sempre, à mulher, em uma sociedade androcêntrica.


     Aí, o emprego do discurso direto, que reconstrói na íntegra, a fala do pai, do apaixonado candidato a marido da filha e de D. Cristóvão parece garantir o caráter memorialístico do poema, na medida em que atenua a subjetividade lírica dos versos. 
    O impacto entre a fantasia da filha e a ironia do pai e de D. Cristóvão (representantes máximos, nesse texto, do poder patriarcal) concorre para intensificar o sentido do silêncio feminino diante da lei. 
    O calar-se, como parte da submissão, que se liga às idéias de fragilidade, passividade e dependência da mulher, espelha, nos versos, a oposição binária entre o feminino e o masculino construída. "Enredo para um tema" testemunha, literariamente, essa opressão.



    CONFEITO

    Quero comer bolo de noiva,
    puro açúcar, puro amor carnal
    disfarçado de corações e sininhos:
    um branco, outro cor-de-rosa,
    um branco, outro cor-de-rosa.


    É a poesia do cotidiano, não do grandiloqüente. Claro que muitos escritores brasileiros já tinham praticado ou pregado a poetização do cotidiano antes dela - dos modernistas a Mário Quintana-, mas em Adélia Prado a transformação do ordinário em extraordinário é soberba, não fosse esse um adjetivo que ela abominaria. A notar, ainda, a sensualidade que ela empresta à religiosidade.

    A questão do feminino surge na poesia adeliana no modo como ela dá a ler um conjunto de práticas culturalmente marcado, de modo que o sujeito lírico ora com ele se identifica, ora dele se afasta, num movimento pendular entre a tradição e a ruptura, o diálogo com os poetas masculinos e a explicitação de sua diferença, de que o poema "Com licença poética", que inicia Bagagem, é exemplar.

    Nota: O poema "Com licença poética" parafraseia o "Poema de Sete Faces", de Drummond:




     A INVENÇÃO DE UM MODO

    Entre paciência e fama quero as duas,
    pra envelhecer vergada de motivos.
    Imito o andar das velhas de cadeiras duras
    e se me surpreendem, explico cheia de verdade:
    tô ensaiando. Ninguém acredita
    e eu ganho uma hora de juventude.
    Quis fazer uma saia longa pra ficar em casa,
    a menina disse: "Ora, isso é pras mulheres de São Paulo"
    Fico entre montanhas,
    entre guarda e vã,
    entre branco e branco,
    lentes pra proteger de reverberações.
    Explicação é para o corpo do morto,
    de sua alma eu sei.
    Estátua na Igreja e Praça
    quero extremada as duas.
    Por isso é que eu prevarico e me apanham chorando,
    vendo televisão,
    ou tirando sorte com quem vou casar.
    Porque que tudo que invento já foi dito
    nos dois livros que eu li:
    as escrituras de Deus,
    as escrituras de João.
    Tudo é Bíblias. Tudo é Grande Sertão.


    No poema "A invenção de um modo", o eu-lírico lança os fundamentos da nova estética em gestação, a qual se caracteriza pela busca do equilíbrio entre pólos opostos. Nada de extremismos – ou isto ou aquilo –, mas há o desejo da busca de unidade, de conjugação e intersecção: “entre paciência e fama quero as duas”, ou seja, isto e aquilo.